Por Santa Catarina de Sena
Carta 187
Para João
Sabbatini, Tadeu Malovoti e os Monges de Belriguardo
1-Saudação e Objetivo
Em Nome de Jesus Cristo crucificado e da amável
Maria, caríssimos filhos em Jesus Cristo, eu Catarina, serva e escrava dos
servos de Jesus Cristo, vos escrevo no Seu precioso sangue, desejosa de vos ver
como soldados sem nenhum temor servil.
2- Valor do Sofrimento na Vida
Cristã
De fato, nosso Salvador quer que tenhamos medo
dele, não das pessoas deste mundo. Cristo disse: ”Não temais aqueles que podem
matar o corpo, mas a Mim, que posso enviar ao inferno a alma e o corpo”(cfr. Mt
10,28). Por isso eu quero que vos afogueis no sangue do Filho de Deus,
inflamados no fogo da divina caridade. É onde se perde todo temor servil,
restando na pessoa apenas o temor reverencial. E que podem fazer o mundo, o
demônio e seus servidores contra quem atingiu o amor sem medida pelo
sofrimento? Nada! Eles apenas nos fornecem a ocasião para provarmos nossa
virtude. Realmente, a virtude é posta à prova pelo que lhe é contrário. A
pessoa deve até alegrar-se e rejubilar-se, deve procurar sofrer sempre com
Cristo crucificado, deve aniquilar-se por Ele, deve humilhar-se. Deve
deleitar-se na dor e na Cruz. E ao desejar o sofrimento, encontrará alegria.
Mas se procurar a alegria, achará a dor.
A melhor coisa é, portanto, afogar-se no sangue e
eliminar nossas perversas vontades mediante um amor livre pelo Criador, sem
termos nenhuma compaixão de nós mesmos. Só então aquela alegria estará em
vós. E deveis esperar os sofrimentos sem nenhuma angústia. Por nenhuma ordem,
que nos for dada, deveremos nos queixar. Pelo contrário, devemos até nos
alegrar. De fato, nenhuma ordem humana será capaz de nos afastar de Deus. Tais
ordens até serão aptas a nos dar a virtude da paciência, tornando-nos solícitos
em abraçar a árvore da Cruz, em procurar a visão invisível que jamais nos será
tirada. Se assim decidimos, a caridade amorosa jamais nos será tomada. Que doce
coisa sermos perseguidos por causa de Cristo crucificado! Quero que vos
alegreis quando a cruz vos é dada, qualquer que seja o modo! Não escolhamos o
modo. Que ele seja escolhido por quem nos faz sofrer. Julgai-vos até indgnos de
sofrer perseguição por Cristo crucificado.
3- Perseverai na Oração e no Amor
Mútuo
Ficai sabendo, meus bondosos filhos em Jesus
Cristo, que foi essa a senda percorrida pelos santos que imitaram Jesus Cristo.
Não existe outra que nos conduz a vida! Quero, pois, que com empenho vos
esforceis por trilhar essa senda, feliz e reta. Perseverai na oração com boa
vontade, sempre que o Espírito vos oferecer ocasião. Não haja desprezo ou fuga
em vós, também com perigo de vida. Não deixeis a oração para poupar e agradar o
próprio corpo. O que o demônio mais deseja ver em nós, para nos afastar da
oração, é que tenhamos cuidados com o corpo e tibieza espiritual. Por motivo
algum tais coisas devem afastar-nos da prece. Recordando-nos de que Deus é
bondoso e reconhecendo nossos defeitos, afastemos as tentações do diabo e toda
autocompaixão. Escondei-vos nas chagas de Cristo crucificado, nada voa
amedronte. Por Cristo crucificado vós tudo podeis. Ele estará convosco e vos
fortalecerá.
4 –Sede Obedientes e Desapegados.
Conclusão.
Sede obedientes até a morte no que vos for imposto,
por mais grave que seja. Não desprezeis o prêmio por causa da dificuldade ou de
alguma tentação do diabo querendo enganar-vos, sob pretexto de virtude,
sugerindo-vos: ”Isto será a alegria de minha vida e faria aumentar a virtude em
mim”. Não acrediteis no diabo, mas sim em Deus, o qual vos dará de outro
modo o que esperais dessa consolação. Vós sabeis que nenhuma folha cai de uma
árvore sem a providência divina. Desse modo, tudo o que o diabo ou as pessoas
fazem para nós, por providência divina colabora para a nossa salvação e
progresso na perfeição. Portanto, acolhei tudo com respeito e despojai-vos dos
bens materiais não necessários. Revesti-vos de Cristo crucificado, inebriai-vos
no seu sangue. Nele encontrareis a alegria e a paz completa.
Nada mais acrescento. Permanecei no santo e doce
amor de Deus. Jesus doce, Jesus amor.
Fonte: Catarina de Sena, Santa, 1347 -1380.
Cartas Completas – Tradução: Frei João Alves Basílio O.P. São Paulo: Paulus
2005. ( Espiritualidade) .pag. 607 a 609.